O Ministério Público Federal (MPF) apresentou denúncia contra sete indivíduos por suposta participação em um engenhoso esquema de fraude licitatória que teria maculado o processo de contratação de obras públicas no município de Patos, sertão paraibano, governado pelo patriarca do presidente da Câmara dos Deputados, Hugo Motta (Republicanos-PB).
Embora nem o deputado nem seu genitor figurem entre os denunciados, o escândalo ecoa com gravidade no cenário político local, sobretudo por envolver vultosos recursos federais, parcialmente viabilizados por emendas parlamentares oriundas do próprio Motta. A obra em questão refere-se à restauração da Alça Sudeste e da Avenida Manoel Mota, esta última batizada em homenagem a um membro da tradicional família que há décadas detém considerável influência política na região.
Entre os denunciados figuram o sócio-administrador da empresa Cesarino Construções (Engelplan), a então presidente da Comissão Permanente de Licitação, o engenheiro contratado pela edilidade e a ex-coordenadora do Núcleo de Convênios da prefeitura, todos acusados de frustração do caráter competitivo do certame, delito que prevê reclusão de quatro a oito anos, além de multa pecuniária superior a 2% do valor contratado. Já os empresários supostamente envolvidos no conluio foram enquadrados no tipo penal de afastamento de licitante, cuja pena pode alcançar cinco anos de reclusão.
Segundo a narrativa ministerial, houve um sofisticado arranjo entre agentes públicos e empresários, com o intuito de restringir a competitividade do procedimento licitatório e garantir a adjudicação do contrato à empresa previamente favorecida. O prejuízo estimado aos cofres públicos ultrapassa R$ 380 mil, valor que escancara a ineficiência e a promiscuidade entre interesses privados e a administração pública.
A Controladoria-Geral da União (CGU), ao examinar os documentos do edital, detectou cláusulas restritivas que feriam o princípio da isonomia e comprometiam a lisura do certame. A denúncia ressalta que várias empresas foram desclassificadas por critérios considerados artificiais, levando à conclusão de que sua participação visava tão somente simular concorrência e legitimar um processo viciado de antemão.
Em trechos incisivos, o MPF aponta que a obrigatoriedade de comparecimento prévio para retirada de certidões fiscais criou um ambiente propício ao vazamento de informações estratégicas, favorecendo a atuação de um cartel articulado nos bastidores do poder municipal.
A obra, cujo custo total está estimado em R$ 4,2 milhões, segue em execução, apesar da tempestade jurídica que ora a envolve. Enquanto isso, paira no ar o questionamento inevitável: até que ponto as engrenagens do poder local, historicamente concentradas nas mãos de poucas famílias, continuarão a operar à margem da transparência e da moralidade pública?
De forma ainda mais preocupante, autoridades de controle identificam a repetição desse mesmo expediente em outras regiões da Paraíba, especialmente em municípios situados nas divisas com os estados do Ceará e do Rio Grande do Norte. Nessas localidades, esquemas de corrupção sofisticadamente articulados têm se valido de uma verdadeira interestadualização da fraude, com empresas e agentes públicos reproduzindo os mesmos padrões de conluio, direcionamento de licitação e simulação de concorrência.
“Infelizmente, estamos diante de um modelo de corrupção que se espalha pelas regiões de fronteira estadual, onde há menor vigilância institucional. O mesmo modus operandi verificado em Patos está sendo replicado em municípios do Alto Sertão e da região do Vale do Rio do Peixe, Piranhas, nas divisas com o Ceará e o Rio Grande do Norte. É uma engrenagem criminosa que exige resposta coordenada dos órgãos de controle”, afirmou um procurador da República que atua na Paraíba e acompanha os desdobramentos do caso.
Diante desse cenário alarmante, torna-se imperioso o fortalecimento das estruturas de fiscalização e o incremento de mecanismos de responsabilização, para que a impunidade não continue a alimentar práticas que transformam o erário em pasto fértil para negociatas e enriquecimento ilícito à custa do interesse público.
Crimes – O sócio-administrador da empresa Cesarino Construções, a então presidente da Comissão Permanente de Licitação de Patos, além do engenheiro contratado pela prefeitura e da ex-coordenadora do Núcleo de Convênios da prefeitura foram acusados pelo crime de frustração do caráter competitivo de licitação (Art. 337-F do Código Penal). A pena é de reclusão, de 4 a 8 anos, e multa não inferior 2% do valor do contrato licitado.
Os quatro empresários envolvidos no esquema foram denunciados pelo crime de afastamento de licitante (Art. 337-K do Código Penal). As penas incluem reclusão, de 3 a 5 anos, e multa não inferior a 2% do valor do contrato licitado.
O MPF requer o recebimento da denúncia, a citação dos acusados, a intimação de testemunhas, a condenação dos denunciados e a fixação de um valor mínimo para reparação dos danos, orçado em R$ 380 mil, em valores atualizados, solidariamente entre os réus. O MPF ainda investiga crimes relacionados à execução da obra e corrupção.
Ação Penal 0800237-71.2025.4.05.8205