A Justiça Eleitoral acendeu o alerta máximo para prefeitos que utilizam a máquina pública como ferramenta de campanha. Em um movimento considerado emblemático e de alta repercussão, o Ministério Público Eleitoral (MPE) mudou seu posicionamento e passou a defender a cassação do mandato do prefeito de Reriutaba, Pedro Humberto Coelho Marques (PSB), e de seu vice, Francisco Tarciano Gomes Castro (PSB), por abuso de poder político e uso indevido de programa público com fins eleitorais.
Segundo o novo parecer, apresentado à 79ª Zona Eleitoral do Ceará, a gestão teria intensificado de forma atípica o programa municipal “Ação Fila Zero”, promovendo um aumento expressivo no número de cirurgias nos meses que antecederam o pleito de 2024. A medida teria sido acompanhada de ampla divulgação nas redes sociais com viés de autopromoção, prática que pode resultar não apenas na perda de mandato, mas também na inelegibilidade por até oito anos, conforme previsto na legislação eleitoral.
Nova posição do MPE muda o jogo
Inicialmente, o próprio Ministério Público havia recomendado a improcedência da Ação de Investigação Judicial Eleitoral (AIJE), sob o argumento de que os atos denunciados ocorreram antes do período oficial de campanha e, portanto, não estariam sujeitos a punição eleitoral.
No entanto, novas provas inseridas no processo revelaram que o pico de cirurgias coincidiu diretamente com o período pré-eleitoral, levando o MPE a reavaliar sua posição. A mudança de entendimento também foi influenciada pela jurisprudência atual do TRE-CE e do TSE, que permite configurar abuso de poder mesmo antes do registro formal de candidatura, desde que haja comprovação de intencionalidade eleitoral e gravidade.
“Os investigados incrementaram os atendimentos de saúde no ano eleitoral e os divulgaram de forma ampla nas redes sociais, fazendo desta pauta um dos carros-chefes de suas campanhas”, destacou o Ministério Público na nova manifestação.
Cirurgias em ritmo acelerado e redes sociais como palco
De acordo com a denúncia, a Prefeitura de Reriutaba teria triplicado a quantidade de procedimentos cirúrgicos no período imediatamente anterior à eleição, especialmente por meio do programa “Ação Fila Zero”. A iniciativa foi amplamente promovida nos canais oficiais e perfis pessoais dos gestores nas redes sociais, com mensagens de agradecimento e celebração, sempre destacando a figura do prefeito.
Especialistas ouvidos pela reportagem apontam que, embora o programa de saúde seja legítimo, seu uso intensificado em período sensível e com finalidade de promoção pessoal pode caracterizar desvio de finalidade, elemento-chave na configuração de abuso de poder.
Pedro Humberto foi eleito com ampla vantagem
Nas eleições de 2024, Pedro Humberto foi reeleito com 62,88% dos votos válidos, vencendo com folga o adversário Osvaldo Neto (PT), que obteve 37,12%. Caso o juiz responsável pela AIJE acate o novo parecer do MPE, tanto ele quanto o vice poderão ter seus mandatos cassados e ficarão proibidos de disputar eleições pelos próximos oito anos.
Reincidência preocupa órgãos de controle
Não é a primeira vez que a gestão de Reriutaba é alvo de alertas por práticas semelhantes. Em fevereiro de 2025, o Ministério Público do Estado do Ceará (MPCE) emitiu recomendação à Prefeitura, solicitando a retirada de imagens do prefeito e de autoridades públicas de repartições e obras públicas, além de advertir contra a utilização de materiais com possível teor de propaganda pessoal.
O histórico de reincidência pode pesar contra os gestores no julgamento da ação, reforçando a tese de que houve conduta reiterada com objetivo eleitoral.
Sinal para prefeitos de todo o país
O episódio lança um alerta importante para prefeitos e gestores públicos, especialmente em municípios do interior, onde a visibilidade institucional costuma se confundir com a figura do gestor. O caso de Reriutaba mostra que, mesmo ações administrativas aparentemente regulares, quando utilizadas de forma desproporcional em contexto eleitoral, podem ser consideradas abuso de poder político, sujeitas a penalidades severas.
Defesa não se manifestou
A reportagem tentou contato com a defesa do prefeito Pedro Humberto e do vice Francisco Tarciano, mas não obteve resposta até o fechamento desta matéria. O portal Espião do Sertão segue à disposição para publicar quaisquer esclarecimentos ou posicionamentos das partes envolvidas.